Sinto saudade de todas as folhas que vejo se despedir com leveza das árvores, mesmo nunca sabendo ao certo o quanto elas queriam ficar, ou se preferiam partir.
Sinto muito por àqueles que tenham perdido a coragem no momento do pulo, porque eu já me joguei daquele terraço do Palace Hotel, que até hoje não fui. Sei que no "quinto andar" deste prédio, ainda há um hóspede insistente que nunca foi embora. (E nem sei se um dia irá)
Esta semana visitei os mortos que, embora esquecidos, permanecem vivos.
Disritmia era como poderia ser intitulada a semana que se passou.
Ela para e pensa, tentando entender tudo o que acontecera.
Respira.
Tenta.
Não pira.
Se inspira.
E volta a disritmia a prevalecer sobre ela.
Seus sonhos ela já desconfia que não lhes pertencem mais, apenas reza baixinho e em segredo para que ninguém os descubra. A cada noite eles se manifestam mais fortes e novamente ela acorda com aquela disritmia que lhe tira o fôlego, e a faz temer que alguém possa tê-los visto fugindo pela janela.
Pela manhã, ela, novamente, respira, e não pira. Sufoca em silêncio tudo o que parece explodir. Seu sangue jorra com velocidade, fruto de pequenos deslizes de uma ansiedade que não para.
O esforço continua... Tenta se acalmar, afugentar os devaneios e se manter no caminho programado.
Estava de passagem. Nenhuma
novidade, sempre os mesmos posters, tudo cinza, tudo igual, quando algo a
chamou atenção. Parecia uma luz, dessas que tem sonoridade. Isso fez com que
ela parasse, res-pirasse fundo e sentisse algo a aquecê-la por dentro. Não era
nada perceptível, era seu segredo. Não pretendia incomodar a ninguém, estava só
de passagem.
Sentiu-se feliz por achar ver
reciprocidade em alguma loucura que parecia pertencer apenas a ela.
Neste dia, ela não estava
disposta a se por a sofrer relendo histórias antigas, noticiadas em jornais não
lidos, como costumava a fazer todas as quartas-feira.
Hoje, ela estava de passagem.
O tempo que passava
sussurrou-lhe : -Corra! Corra!
Apesar de tudo, não sentia o
desejo de entorpecesse como era comum nas quintas, mas mesmo assim, foi atrás
de sua taça de vinho, sempre a boa companheira de noites como aquela, quando algo
misterioso a surpreendia.
Já estava mergulhada em
lembranças de infância, quando percebeu que ainda era terça-feira e que não
adiantava esperar por mais. As terças são sempre simplórias.
Ele falava em
frio e não sabia quanto queimava aquele silêncio típico das noites de julho.
Todos os fogos já pareciam ter explodidos, com exceção daqueles que as crianças ainda soltavam, pois elas teimavam
em não deixar os festejos acabar.
Afinal, criança é assim mesmo;
sente demais, ama demais e não deixa o bom acabar tão rápido, mesmo quando se é
preciso, elas reinventam mundos fantásticos para manter suas fantasias sempre
vivas.
Que criança
lembraria de calçar sandálias, ou se importar com roupa durante uma brincadeira (lembrando
que brincadeira para elas é coisa séria)? Como elas iriam lembrar do
frio, em meio a toda excitação de sentimentos? E quanto tempo o silêncio resistiria?
Inconsequentes, seguem seus sonhos.
Por
hora criam heróis, em outro momento os transformam em bandidos. Algumas vezes
amam, em outras, odeiam (aquela birra passageira, típica delas). E assim seguem vivendo intensamente, cada dia, em seu mundo feito de algodão doce, sempre torcendo para que nada disso acabe.
Ela acorda e sempre a mesma
música a vem perturbar.
Talvez seja o seu desejo de
fugir do mundo que a levava a escutar sempre a mesma canção.
Ela escuta a melodia e se deixa
embriagar por aquelas letras que faziam passar um filme em sua mente. Ela
delira e canta como se estivesse confessando para alguém seus desejos mais
profundos. Canta de olhos fechados como se pudesse transcender, ser levada dali
para algum lugar mágico, onde os sonhos se tornam realidade. Por um momento,
sem querer, abre os olhos e percebe que ainda está tudo no
mesmo lugar, como se quisesse voar pela melodia daquela música, volta a fechar
os olhos e se vê, novamente, envolta em seus desejos.
Ao sentir seus sonhos ali tão
clarificados se sente hipnotizada, uma sensação de leveza e calma se apossa de
seu coração, mas a música já dá sinais que vai acabar.
Chora por mais um pouco de ópio
para neutralizar a dor.
"Deus me faça brasileiro, criador e criatura
Um documento da raça pela, graça da mistura
Do meu corpo em movimento, as três graças do Brasil
Têm a cor da formosura..."
Em busca de sonhos impossíveis...