Fernanda França

Tá rosa de quente
Tá branca a solidão.

Azul multidão,
Sussurra em um grito:
Tá frio que queima
Tá sem emoção.

É clara a ilusão
Que a cidade alerta:
Tá nuvem de asfalto
Riacho de pedra.

Sem muita paixão
Esvaem-se os dias

Finda-se julho 
Sem mais fantasias.
Fernanda França

Estava de passagem. Nenhuma novidade, sempre os mesmos posters, tudo cinza, tudo igual, quando algo a chamou atenção. Parecia uma luz, dessas que tem sonoridade. Isso fez com que ela parasse, res-pirasse fundo e sentisse algo a aquecê-la por dentro. Não era nada perceptível, era seu segredo. Não pretendia incomodar a ninguém, estava só de passagem.
Sentiu-se feliz por achar ver reciprocidade em alguma loucura que parecia pertencer apenas a ela.
Neste dia, ela não estava disposta a se por a sofrer relendo histórias antigas, noticiadas em jornais não lidos, como costumava a fazer todas as quartas-feira.
Hoje, ela estava de passagem.
O tempo que passava sussurrou-lhe : -Corra! Corra!
Apesar de tudo, não sentia o desejo de entorpecesse como era comum nas quintas, mas mesmo assim, foi atrás de sua taça de vinho, sempre a boa companheira de noites como aquela, quando algo misterioso a surpreendia.
Já estava mergulhada em lembranças de infância, quando percebeu que ainda era terça-feira e que não adiantava esperar por mais. As terças são sempre simplórias.
Então, sem mais, ela simplesmente passou.
Fernanda França
Ele falava em frio e não sabia quanto queimava aquele silêncio típico das noites de julho. Todos os fogos já pareciam ter explodidos, com exceção daqueles que as crianças ainda soltavam, pois elas teimavam em não deixar os festejos acabar. 
Afinal, criança é assim mesmo; sente demais, ama demais e não deixa o bom acabar tão rápido, mesmo quando se é preciso, elas reinventam mundos fantásticos para manter suas fantasias sempre vivas.

Que criança lembraria de calçar sandálias, ou se importar com roupa durante uma brincadeira (lembrando que brincadeira para elas é coisa séria)? Como elas iriam lembrar do frio, em meio a toda excitação de sentimentos? E quanto tempo o silêncio resistiria? 
Inconsequentes, seguem seus sonhos. 
Por hora criam heróis, em outro momento os transformam em bandidos. Algumas vezes amam, em outras, odeiam (aquela birra passageira, típica delas). E assim seguem vivendo intensamente, cada dia, em seu mundo feito de algodão doce, sempre torcendo para que nada disso acabe.
Fernanda França

Ela acorda e sempre a mesma música a vem perturbar.
Talvez seja o seu desejo de fugir do mundo que a levava a escutar sempre a mesma canção.
Ela escuta a melodia e se deixa embriagar por aquelas letras que faziam passar um filme em sua mente. Ela delira e canta como se estivesse confessando para alguém seus desejos mais profundos. Canta de olhos fechados como se pudesse transcender, ser levada dali para algum lugar mágico, onde os sonhos se tornam realidade. Por um momento, sem querer, abre os olhos e percebe que ainda está tudo no mesmo lugar, como se quisesse voar pela melodia daquela música, volta a fechar os olhos e se vê, novamente, envolta em seus desejos.
Ao sentir seus sonhos ali tão clarificados se sente hipnotizada, uma sensação de leveza e calma se apossa de seu coração, mas a música já dá sinais que vai acabar.
Chora por mais um pouco de ópio para neutralizar a dor.

Abre os olhos e volta a trabalhar. 
Fernanda França
A gente tenta.
A gente tenta seguir e não parar,
não olhar para trás
e simplesmente seguir.

Mas uma hora ou outra...
As folhas caem,
o sorriso se faz
e se desfaz

A vida segue.
Não para.

A vida segue:
incrédula,
impiedosa,
insana.

A vida segue.
Por favor,
A vida cegue.